24/08/2013

VII

Como desejar esquecer tudo o que aconteceu sem o querer? Sinto-me entre o racional e o sentimental sem saber até que ponto esta ideia me atravessa o pensamento. Como odeio contar uma história que tem fim... E por mais factual que seja, não consigo aceitar a realidade que foi ilusão.
O tempo é manipulador da matéria. E com ele multiplicam-se as diferenças de vida. De estágios. Nas raras excepções registam-se atrasos de vida ou adiantamentos precoce. O padrão dita a soma da vida por viver e dela já vivida. Esse é o real desfasamento.
Foi ingénuo pensar que poderia construir uma vida com alguém que já a tinha construído. Não é mais que uma usurpação de uma vida. Não a construção. Mas essa foi a realidade. Apeguei-me a uma vida que não era a minha. E a ilusão foi aceitar. Pelo deslumbramento. Pela tão humana pessoa que apresentava perante mim. Talvez o tempo traga consigo a simplicidade. A forma como encaramos a vida. Mais pacífica.
Foste tu que me permitiste viver um tempo da tua vida Margarida. Porque foste tu. Foste tu que mantiveste um percurso de vida linear, contínuo. Para o meu ser, capturando a realidade de forma distante, essa foi uma ruptura abrupta, foi contra-natura ao meu percurso de vida. E não me refiro a diferenças temporais. Significa no objectivo, no curso, no futuro...
Mas eu não conduzi a minha vida por esse trajecto. E simplesmente tudo tornou-se realidade. Era tudo que queria, a vida perfeita. Mas já estava tudo feito sem ter sido necessário um mínimo do meu esforço... E o nosso futuro?
Apesar dos altos e baixos, das discussões e pazes, ter a genuína capacidade de te olhar nos olhos e sorrir. A rotina e os momentos inesquecíveis. As festas-surpresa, os jantares, peças de teatro, concertos, os retiros de fim-de-semana. E finda a utilidade pública, desfrutar os restos dos dias junto de quem se ama a realizar o que se gosta. A inevitável morte de chegados, as fortes discussões. Mas tudo é vida. De todos. É impossível. Mas foi contigo que escolhi passar por tudo isso. Ou foste tu?
Devia ter-te perguntado pelo teu futuro. Mas a verdade é que passa por um pressuposto muito básico. Ver-te no meu percurso de vida. Deixar que o tempo escorra pelas nossas veias. Eu apenas me ajusto para chegar a esse fim. Mas não traço o caminho. Todas as estradas vão dar a Roma. Seja elas quais forem. E não são as estradas. É Roma. Cada qual tem a sua.
É certo que não deve ser difícil prever um futuro muito provável de uma pessoa quando verdadeiramente a conhecemos, quando nos é revelada a maneira de viver até esse ponto.
O nocturno tormento. A cama é um puzzle e desconheço o meu lugar. Num lado reside um espaço que deveria ser ocupado.
Não consigo continuar assim. De prosseguir. De alguma forma tive de pausar a minha vida. Não me sentia em condições de continuar a minha vida. Resume-se ao que quero ou evitá-lo. Entre o sentimental e o racional. Não te quero rever mas também não sei se tenho consciência desse facto. Não quero sofrer. Porque o teu olhar será um que já expirou Margarida. E não seria mais que um encontro com uma realidade que já constatei mas que não deixa de me atormentar.
É mesmo verdade. Antes de te conhecer sentia-me bem. Não me sentia em paz mas isso também aconteceu só em breves momentos da minha vida. Também não estava propriamente satisfeito com a minha vida mas pequenos planos futuros começavam-se a formar, futuros próximos mas ainda assim futuros. Sentia-me calmo. Agora reflecte-se o mesmo mas de forma mais passiva. Talvez seja esta a minha natureza. Na altura tinha feito as pazes com as minhas perspectivas. A minha situação respondia aos serviços mínimos de imaginação do resto do percurso do meu ser. Iria desejar mais mas naquela altura a realidade era-me aceitável. deixou de ser.
Quero deixar de te amar Margarida. Quero deixar de te lembrar sempre que vejo um pequeno ser Ariana. Até ao fim.

15/10/2011

IVII

O início do fim.
Sinto ser de um egoísmo profundo desejar que esse ciclo perdurasse pela minha existência. Sentir por perto a tua existência. A tua alegria. Minha doce princesa. Minha doce Ariana. Tu foste o mais doce despertar da mente. Tu és o que nunca teria desejado sem nunca ter cruzado a minha vida com a tua. A tua demente alegria contagiante perfurou o meu ser de forma voraz e como eu queria ser completamente devorado. A minha fantasia genética nunca foi para além de um ser meu semelhante. E como está errado pelo puro egoísmo. Era-lhe imediatamente privado o direito à felicidade ou, no seu estado mais minimalista, uma luta brutal para alcançar esse estado imaculado de viver feliz. Mas tu já detinhas esse poder. E é tão bom de se ver. E principalmente de se sentir.
Ainda me recordo do primeiro dia que te conheci. Foi uma decisão tomada, mas não controlada. Apenas as circunstâncias diárias levaram a essa encruzilhada e foi decidido o caminho a tomar. E tu, na tua leveza de ser, também aceitaste. Aceitaste como uma oportunidade para viver. Querendo conhecer e dando-te a conhecer.
Recordo-me do dia em que nunca cheguei a despedir-me. Apenas saí da tua vida...
Não sei se por não querer ver-te chorar, se por ter medo de não chorares. Parte de mim quer ou queria, ou seja que terminologia gramática seja adequada a um sentimento que ainda perdura, ter um impacto em ti. Talvez por querer saber que reconhecias o sentimento que nutria por ti. Talvez o chavão "fizeste o melhor que podias" fosse apropriado. Mas isso deixa uma lacuna tão grande de incompetência. E agora, faria melhor? Deixavas de sentir medo de mim? Seria capaz de retirar do meu próprio instinto os constantes actos de rectificação de acções, a frieza de certos actos que cometi? Seria eu capaz de te deixar respirar essa felicidade que eu tanto amo e ver-te simplesmente pela criança que és e não o adulto em que te tornarás? Mas todas estas questões têm um princípio básico: o de que eu teria impacto no teu ser. Talvez tenha sido melhor sair da tua vida, embora a forma como o tenha feito poderá não ter sido a ideal. Mas é a única que sei fazer. Depois de ver num espelho a imagem que nunca quis ver, percebo que será essa que percorrerá o meu caminho. E devo-te agradecer teres-me mostrado. Não por ter gostado dessa imagem, mas porque ao menos vejo alguma coisa.
Mais que pedir desculpa, gostaria que me perdoasses e, dando conta do meu egoísmo contínuo, que sentisses que te amei, mesmo que esse amor tenha sido demonstrado de uma forma completamente deturpada.
Gosto do teu nome Ariana, mas prefiro o verdadeiro.

12/10/2011

IVI

Agora que percebo como tudo aconteceu, desespero por um lapso de compreensão. Porque tu, Margarida, foste o mais belo monstro alguma vez criado. Porque tu, de forma inegável, representas o caos. O lógico e racional mundo caótico a que chamamos vida.
Tinha regressado ao estado minimalista da vida. A perfeita harmonia entre o existir e o não ser.
Que curiosidade te avassalou para desejares conhecer-me? E à medida que falávamos, dialogávamos, que percorria os teus pensamentos, desejava perder-me neles. Porque eram simples e pacíficos. Porque eram perfeitos na sua imperfeição. Porque esses pensamentos tinham um traço de ingenuidade que se permitiam em si ser sentimentos. E à medida que o tempo permitia mais te desejava. Mas, na minha insofreável essência não me era permitido actuar, mas sentia um mínimo de satisfação com a imaginação.
Mas tu não. E isso és tu, em toda a tua plenitude. E agiste em conformidade com o teu ser.
E tudo fora como início da escrita, reapredizagem da linguagem, da locomoção, de tudo o que se apreende. Mas de outra forma. Tudo o que vislumbrava era, de uma forma encantadora, novo e curioso. O tempo passava por brechas que não reconhecia. Um admirável mundo novo.
Mas foi o início da ruína. Enquanto percorria esse admirável mundo, seguindo os teus passos, senti-me cada vez mais pequeno, dada a imponência dos vivos que o habitam. Foi aí que tive consciência da verdadeira distância que nos separava. Senti ser impossível ser habitante desse mundo. Comecei então a fazer o que sempre me habituei. Com uma calma doentia iniciei o encerramento da parte sentimental que cria, mantém e desfaz as relações. Incessantemente questionavas o meu estado e eu permanecia calado, desprovido de voz. Como é possível dizer a alguém que se ama que vai ser incapaz de a fazer feliz? Que não se é mais do que um falhanço que a espaços se concede a honra de ser um mero erro? Para isso seria necessário coragem, coisa que um covarde é desprovido.

05/08/2010

Histórias a Preto e Branco

A porta fechou-se e o pranto irrompeu.

Na sala, ainda o calor dos corpos intensos do êxtase. Dos abraços, do frenético desejo, do perfume e da fusão. Da noite sem sono, das longas e sôfregas conversas e da viagem do paraíso ao inferno.

Percorri as imagens, em retrospectiva, desde o primeiro minuto, da primeira visão.

A irritante fila do café. A espera pela dose diária de cafeína para funcionar e subitamente a descarga de adrenalina pelo encontro. Dez minutos de ficção na minha cabeça. O filme, a banda sonora, muitos actores secundários, dois actores principais, um amor inevitável.

Acordei com uma mão a dar-me o troco dos cinco euros, a chávena de café a escaldar em cima dos meus dedos e uma voz indisposta. Obrigada e volte sempre. Voltaria de certeza, mas para te ver. Não mais poderia perder de vista o teu olhar.

Agora com a porta a fechar-se atrás de ti, duas certezas iniciavam aquele dia. A primeira de que aquele era o verdadeiro amor. A segunda que nunca mais queria voltar para lá. A terceira, que tinha dez minutos para disfarçar a catástrofe na minha alma e chegar ao novo trabalho a 30 km de distância. Como é que era possível continuar a viver conjugando as três coisas.


Inicio. Quotidiano. Evito relembrar a felicidade. Retornar incessantemente à infelicidade. Percorro este insignificante caminho que dois dias antes era tudo o que desejava. Intransigente humano. Para que serve agora o que tanto desejava? Tudo se tornou insignificante. O plano era perfeito. Tinha conseguido o feito de retornar a vida de um ponto despejado de sentimentos. Entrava num percurso materialista e independente. Tudo era meu e permanecia ao meu alcance.

Anuncio-me e aguardo pela chamada. Trabalho burocrata, de escritório, horário fixo, seguro de saúde e carro da empresa. Tudo o que era tão simples se tornou agora vazio de significado.

Deste-me uma razão para viver e espero que me expliques porquê.


Nem sequer precisava tentar justificar o porquê da tua importância. Irrompeste sem explicações dentro de mim. Como um pensamento recorrente e latejante. Do qual quanto mais tentava livrar-me mais terreno tomava. Creio que é assim. Dizem. Que se distingue dos demais. Dos equívocos. Que parecem servir-nos, como uma peça de roupa que nos fica bem ao espelho mas que nos aperta aqui e ali e que acabamos por despir com alívio. Tu ao contrário foste tomando posse das minhas horas e tornaste-te não uma mera peça de roupa, mas o meu próprio corpo. Em fusão.

Aqueço as mãos, numa chávena de chá matinal entre reuniões. À minha volta ninguém adivinha o ódio bastante para trucidar quem por mim passe. Sorrio aos cumprimentos sem expressão. Formatação, é a palavra de ignição com que tenho percorrido os dias, as semanas nesta nova personagem. Não tem sido muito diferente de estar num jogo. Virtualmente funcionante, a subir gradualmente os níveis, a conhecer cada vez mais as regras. Nem me estou a sair nada mal. Começo até a sentir um certo prazer em nada esperar. Sem desejar nada e sem construir nada, não tenho de viver o incessante exercício do controlo.

A cumprir o plano de manter neutros os sentimentos, vivo em compromisso temporário com a existência, enquanto espero pela tua explicação do porquê. Chegue ela de forma chegue. Porquê.

Se irrompeste dentro de mim acendendo a luz, convocando os meus sentidos pelas palavras, fazendo aparições em todos os lugares interessantes, permitindo-me descobrir cá dentro uma força que nunca julguei. Porque te mandei embora e não tenho dúvidas?


Porque fui eu embora? Devia ter gritado, esperneado, soltar a raiva de querer. Mas não. Quieto e impávido arrumei as minhas coisas enquanto me sentia cada vez mais desmembrado e destruído a cada segundo que passava. Meticulosamente ia empacotando tudo o que de meu pertencia e como te queria guardar, dizer que eras minha. Mas não o podia, não desta forma. Não fazia sentido no meu eu lutar pelo teu amor, não que não o merecias, mas não podia vislumbrar tudo isto como uma guerra. A vida sim é uma guerra, que acabou de perder o sentido de ganhar.

Era tudo perfeito. Trabalho burocrata, de escritório, horário fixo, seguro de saúde e carro da empresa. Tudo o que era tão simples se tornou agora vazio de significado.

Deste-me uma razão para viver e espero que me expliques porquê. Porque agora nada faz sentido. Sinto-me agora distante de tudo e tudo distante de mim. As expectativas matam e esfolam à medida que passam pelas veias do ser.

Talvez me caiba a mim aceitar as distantes realidades entre os nossos seres. Mas como posso eu aceitar uma coisa que já sabia? Que quis contrariar com toda a minha força? À medida que te foste aproximando tornaste-te aos meus olhos mais humana, falível… e era isso que adorava em ti. Esse teu calmo mar de ser. Urge-me dizer que a desconfiança era muita por não acreditar na possibilidade de existência de algo tão pacífico, tão límpido e verdadeiro.

Mandaste-me embora porque percebeste que não foi minha a força que detinhas, mas sim de um equívoco.

19/02/2009

IV

Ainda não sei como tudo aconteceu. Queres falar sobre?
Ainda bem que perguntas. Sentes-te para? Apetece-me rir na tua cara. Pretendo ver-te completamente desprotegido caído no chão e rir até não poder mais. Quero sentir por todo o meu espírito a doce ironia do teu ser. Quero-te rasgar pedaço por pedaço.
bem tento recuar com as palavras, tento compreender que errei. Não me consigo encarar.
Compreendes agora o ridículo a que chegaste? Aceito a frustração que sentes ver finda a tua vida e não teres recuperado absolutamente nada mas não me culpes por rir. Durante todo este tempo permaneci calado a ouvir os teus desvaneios sobre a tua vida miserável. Tu próprio.
Não poderia encaixar o meu ser de outra forma. Seja de forma genética, hereditária, bilógica, algo que ciência certa e absoluta possa explicar. Ou sou eu. Ou não sou. Ter que explicar erros humanos cai na certeza do desespero. Culpo o meu eu. Desculpabilizo-me.
Durante largos anos encurralaste-me na tua penosa cabeça. Encheste-a de pensamentos, dos ses, de consequências, das culpas de não fazer. Só a espaços me concedias o direito de te suplantar. Mas olha-me de ódio. Retribuo-te com raiva. Porque foi durante esses espaços que te concedi alguma felicidade que com esse teu grandioso ser desprezaste, abandonaste, suprimiste em nome do que chamas Ser Verdade. Meu caro amigo. És pura mentira. Criaste-te sem parâmetros lógicos
Pára, peço-me. Tive de me construir de alguma forma. E se me destruí, algo havia para o fazer. Não poderia acreditar numa mentira que se tornava cada vez mais verdade.Compreender que o que acredito não o posso ter era-me ainda difícil de aceitar.
Caíste em ti próprio. Ou em mim. Quando me tocaste percebeste a tua inexistência. Chegaste ao fim da tua equação. Assim que compreendeste que na verdade eu cresci sobre ti deixaste de ser razão. Por isso é irónico. Não me culpes por gostar de te ver perdido no teu próprio labirinto.
E agora? pergunto-me. Mereci viver? Que justificações encontro para a minha existência?

24/01/2009

III

Ainda não sei como tudo aconteceu. Mas lentamente percepciono o início. A tomada de posse do compulsivo monstro a que chamamos Fim. Mónica. Sei agora porque chorar. Tornaste-te captiva do passado. Agarraste-o para se tornar teu nosso futuro. Foram escassos os minutos que sonhámos ser a nossa eternidade.
Em que monstro te transformei. Pior a loucura na qual te vi. Aguardei que o dono do tempo me viesse buscar mas ambos aguardámos demasiado. Torna-se agora claro que tudo deveria terminar mais cedo. Enquanto detínhamos o poder das nossas decisões. O puro mudou-se a insanidade, a razão simplesmente morreu.
Na mórbida tarde em que saíste ambos sentimos a angústia da razão subir ao trono onde reinava o amor. Nosso.
- Eu chamei-te à razão. Corpo e imagem co-existem. Unos e inseparáveis. Precisas agarrar o que sentes.
mas tudo é tudo é tão superior. O sentimento é. Amor. Até a própria consciência o é. A razão nasce para ser superada. Criámos algo superior a instinto. Temos poder para deliberadamente oferecer a nossa vida a outrém. Superámos o físico. Somos trancendentes. Eu morri. Decidi. Escolhi por opção. Não segui o natural. Sou contrário ao natural. Todos o somos de forma. E eu senti-te neste princípio Mónica. Que cobardia te atacou para o perderes? A revolta é contra a revisão. Eu amei-te. Ou pelo menos achei. Criam-se incertos desde a chegada. Queria tanto perdurar. Terminar o avanço da progressiva continuação do quotidiano e ter-te como sentimento de culpa. A continuação do tempo garantiu-me forças e resistências. Garanto a solidão como verdadeira companhia. É a certeza.
Foi. Chacinaste a minha razão. Tornaste o corpo que dera à imagem numa multiplicação de ruídos indecifráveis. E tudo fora como início da escrita, reapredizagem da linguagem, da locomoção, de tudo o que se apreende da vista. Antes de crescer, renascer tornou-se por obrigatoriedade.Tudo o fizeste com um simples olhar Margarida. Na tentativa de te conhecer, dominaste-me. Até ao fim.

15/09/2008

II

Ainda não sei como tudo aconteceu. Mas eu sei. Desviei-me. Percorri um longo caminho errado. Porque me olhas de raiva? Porque me acusas de ter terminado uma bela vida? Será o mais correcto a continuação onde o sentimento não se sente na sua plenitude? Por breves momentos esqueci-me. Sim. Principalmente por ti doce Ariana. Mas para fazeres sentido no pensamento ainda não te posso. Sei que foste a salvação de muitos, mas por ora não te posso. Porque és tu o meu último arrependimento, só me posso recriminar no fim de todas as opções.
- Nesse instante, nesses segundos em que iniciaste o passo vazio, destruíste-a,
olho-me com os nervos da razão. Alterei a minha inexistência e em si perdi-me no diabólico. Desisti de um ser de falsas verdades e na minha ilusão destruí-a. Agora não. Recordo-te agora Mónica. Recordo-te nesse sorriso colocado em tantos sítios. Recordo-me de olhar fixamente, abstraído de convivialidade abstracta que permanece distorcida no diluído de brindes como simples nexo da fuga do real. Nisso permanecemos reais. O mesmo. Mas para outras conclusões. Sentia os ruídos, as movimentações rápidas e desorganizadas do passar do tempo. Um pouco mais abaixo do olhar permanecia intocável a terrível pratada. A instituída norma de acompanhante de alcoól caseiro. Como ambos têm sabores horríveis decido-me pelo copo. Iniciam-se pensamentos nefastos e pagãos. São seios voluptuosos, lábios de um avermelhado carnal, umbigos suados pernas em mim acorrentadas, mãos a percorrer a pele já quente e desejosa de prazer. As movimentações tornam-se cada vez mais enubladas. Foco-te Mónica. Tu sufocas-me. Permanecemos de olhar felino já com o gosto da presa na boca.
De súbdito os braços errados acordam-me. É certo que foi nesta réstia de lugar, exactamente neste mesmo sítio Margarida. Mas deixa-me primeiro amar Mónica para passar a odiá-la e então existes. Iremos.
- Talvez até demais ou não o suficiente, qual preferes?
Regresso. Encontro-me agora no meio de um enorme alvoroço. O jantar aproxima-se da sua inutilidade. As vozes começam a agravar e a diminuir de sentido. Entre a desorganização vocal ouve-se o planeamento do posterior. Navego com o olhar entre o denso nevoeiro criado pela infindável quantidade de tabaco fumado. A visão tropeça no dono deste antro afável. Homem de merecido pouco respeito compatível com a sua miserável estatura. Permanece meio escondido por detrás do seu balcão, remechendo os olhos, tentando captar algum sinal de caloteiros ou queimas de pedras. É tudo a mesma merda! afirmava ele num dia mais descontraído. Drogados e ladrões. Era tudo a tiro. Vindo de uma boca tão grosseira não espanta esta ridícula antítese. Ele mesmo é. Sabe-se por toda a cidade que outrora fora pássaro engaiolado e os seus conhecimentos não são os mais de respeito social. Pouco importa no seu ser. Mas importante são as transacções, negócios, dinheiro, rico! quero é dinheiro! regalava-se só no pensamento de notas apinhadas o som de moedas a cair sobre uma prévia pilha delas. Um olhar mais atento vê a sua maneira bastando sentir a suavidade com que ele maneja os seus fios e pulseiras, anéis.
Imediato ao estalar de uns dedos. O recuo dessa misteriosa mão leva-me a uma cara quase fumegante que atiça um Aposto que te esqueceste de mim. Como poderia eu? Não quero nem podia. Apenas aliviei.
- Tenho de admitir que ela era única
também cedo ao que permanece impossível e negar. Fora a única que preenchera as duas partes conflituosas do humano. Aprisionara a paixão e o amor e jogava com essa dualidade como só ela o sabia.
- Não o negando sei ao contrário desse vazio, que seríamos um simples jogo até ao fim.